05 junho 2008

Histórias de bruma

«I don't care too much for money
Money can't buy me love»

Somente Deus conhece o destino de cada um, mas quando Amanda nasceu no seio daquela família fulano de tal que podia dar tudo aos seus descendentes, todos souberam de antemão a sorte que lhe estava reservada.
Cumprindo o seu fado, Amanda cresceu ao cuidado de amas, foi educada por tutores de renome, aprendeu regras de etiqueta, a falar várias línguas, a ser adaptável a ambientes e pessoas diferentes, tudo o que fizesse dela uma princesa dos tempos modernos.

Na família fulano de tal nunca existiu espaço para questionamentos, a ordem dos acontecimentos fluía de tal forma que quase poderia ser tida como natural. E seria, não fosse Amanda curiosa e atenta a tudo o que acontecia para lá da janela do seu mundo encantado. Ainda pequena estranhava as crianças descontraídas e de aspecto até um pouco desleixado na fila dos autocarros escolares, ou que aos fins-de-semana corriam descalças, acompanhadas pelos pais, no parque onde ela só ia com amas e seguranças e sem permissão para tocar na relva. Estranhava, mas era nova demais para entender o alcance daquelas diferenças.

Com o passar do tempo a menina dos vestidos cor-de-rosa cresceu e com ela cresceram também as dúvidas, curiosidades, interesses, desejos, e consequentemente a rebeldia. Começou a usar roupas diferentes às escondidas, aprendeu a mentir e a dar novos fins ao dinheiro dos pais, e nessa descoberta de um mundo novo, conheceu muita gente fora do seu círculo comum de amigos fulano de tal, entre eles Pierre. Foi dele o seu primeiro beijo, as primeiras loucuras, a primeira vez, o primeiro delito, a primeira bebedeira, a primeira experiência com drogas. Foi com ele que entrou num mundo paralelo que aos poucos a afastava de quem era, se é que Amanda algum dia se conheceu.

Passaram-se muitos anos de vida dupla, uma outra característica da família fulano de tal é a falta de tempo ou vontade para prestar atenção ao que realmente importa, até que após semanas de busca, o corpo de Amanda foi encontrado abandonado numa cave nos subúrbios da cidade. A cave funcionava como sala de chuto.
Contrariando as previsões e a ideia de que o dinheiro compra tudo, Amanda não cumpriu o seu destino. Para a imprensa e demais senhores fulanos de tal foi passada a informação de que a herdeira fora raptada para cobrança de resgate e tragicamente assassinada pelos raptores. Embrulhada na manta de falsas aparências que regiam o seu mundo, Amanda foi enterrada sem questionamentos e sem mácula. Afinal, ela era Amanda Fulano de Tal e meninas nascidas em berço de ouro não morrem de overdose numa sarjeta qualquer.

26 comentários:

Janaina disse...

Uau!
Adorei essa história.
Beijos, querida.

c disse...

Nossa. Será que Amanda quebrou tantas regras assim porque queria atenção ou pq se sentia tão diferente assim das demais pessoas?

beijo mana

Lomyne disse...

Conheço tantas Amandas... Não são da família Fulano de Tal e ainda não morreram, mas quantas e quantas moças de classe média muito alta vivem uma vida dupla com uma família desatenta...

A Flor disse...

Minha doce Amiga :) Boa Noite linda! :)))

Quantas e quantas Amandas há por ai... eu até que conheço algumas... :(

Querida fico-Te grata pela tua presença lá no meu canto! :)

Sei que ando ausente, mas não tenho tido tempo... agora arranjei um part-time e felizmente está a dar certo... quando à noite me deito... durmo que nem uma pedra de tão cansada que ando... mas não vos esqueço... NUNCA! Lembro-me de todos vocês nas minhas orações matinais, acredita Amiga, que é mesmo assim! :)

Que tudo de bom a vida te conceda minha doce e querida Amiga.

Mil beijokinhas te deixo nas tuas bochechas, nesta noite em que arranjei um tempinho para vir espreitar de fugida o teu doce cantinho! :))

Dorme bem e que Deus te proteja minha querida

Flor

Mel disse...

Carmim, isso me fez pensar em nossos destinos... Claro que não temos a obrigação de seguir o que os outros querem, mas devemos ter cuidado com as nossas escolhas... E ela parece ter andado apenas pelos extremos. Nada em extremo pode fazer bem...
E as nossas escolhas precisam de equilíbrio e sensatez. Que os extremos sejam parte do caminho, mas não um fim.
Beijos pra ti.
Mel

Patrícia Andréa disse...

Adorei a história!!=)

Bjus!!

Ana Amelia Teixeira disse...

O fim foi uma realidade triste!!!
bjuxxx

Jana disse...

Uma bela maneira de mostrar que antes de tudo, atenção é necessário.

beijo

Ruberto Palazo disse...

Essa história, além de muito bem escrita, é cenário perfeito para várias temáticas de discussão...

Mas me fez lembrar que quando somos "aprisionados" e vivemos isolados do mundo, qualquer novidade desperta nosso instinto curioso e na primeira oportunidade saímos para conhece-lo. Nosso corpo e mente curiosos são territórios propicios para qualquer novidade, que age como faísca e faz nosso corpo arder de prazer a cada nova descoberta.

Ser criado em uma redoma sem ser apresentado ao mundo, cria pessoas ignorantes e que vivem apenas da fachada daquilo que a Familia Fulana de tal quer "preservar". E mesmo na morte, a imagem da menina da familia fulana de tal nao é quebrada.

Impressionante como algumas pessoas colocam a imagem acima de coisas muito mais fundamentais.

=)*

Ana Casanova disse...

Esta história diz-me tanto...mas só o inicio dela!
Sobre o dom que tens de escrever e passar mensagens, começo a tornar-me repetitiva, não é minha querida? Lol
Certas pessoas vivem apenas de aparencias, do que parece bem ou mal e esquecem o mais importante.Que somos seres humanos, que precisamos de amor e carinho muito mais que de bens materiais.
Existem muitas Amandas na vida, infelizmente!
Um beijo com muito carinho.

Anónimo disse...

Infelizmente o mundo é assim mesmo: frio e cruel com todos.
Beijos!

Rosi Gouvêa disse...

Procuro dizer o que sinto
Sem pensar em que o sinto.
Procuro encostar as palavras à idéia
E não precisar dum corredor
Do pensamento para as palavras...

...Alberto Caeiro...

Fico muito feliz com sua visita!
Espero ver-te sempre por lá...
Sempre me encontrarás por aqui!

Deixo para ti, meu desejo de um
belo fim de semana!

Doces beijos

NayB. disse...

Há pessoas que só enxergam o que seus olhos querem ver... Esta história foi baseada em algum fato ocorrido ai?

Bem, aqui em Junho começa o inverno, mas na cidade em que moro inverno não implica em frio... rsrs

Xerus
=***

Ariana Coimbra disse...

Acho que se fosse pra mim seguir o que os outros querem eu não conseguiria não, iria bater o pé!
rsrs
Belo texto!

Beijo*

Mari disse...

Oi,linda
Essas histórias sempre me deixam abatido quando terminam desse jeito..a gente sabe que existe,mas prefere não saber,né?Mas,claro que existem milhares por aí...
Ótimo texto!
bjs


*Já escrevi um monte de textos e que não saem publicados..espero que o último seja...meu Blogger está dando erro!!

Jac C. disse...

Nossa, que texto forte!
Não tem como não pensar além das linhas que publicaste.
Bjs

Cadinho RoCo disse...

Pois é assim que de muitas camuflagens o ser humano tece sua própria hipocrisia.
Cadinho RoCo

Cin disse...

Daqueles contos com resquícios de realidade.
Mto bom!
Boa semana querida!

Flávia disse...

Essa história, para mim, foi tristemente familiar... já conheci tantas Amandas... talvez eu mesma, durante um certo tempo, tenha sido uma delas - criada dentro de uma superprotetora e impenetrável redoma de vidro, alheia à crueza da realidade. A gente esquece que o vidro um dia se parte, e que a realidade nos traga com todo ímpeto. E é preciso morrer por dentro, para renascer por dentro... a tempo de fazer parte do mundo real sem se deixar esmagar por ele.

Beijo, querida.

momentos disse...

Texto chocante!!!!
Ao mesmo tempo preocupante...
Deixando uma sensação de vazio...
Nossa sociedade está impregnada...
De falsas moralidades...
E muitas vezes o perigo está...
Exatamente em nossas escolhas...
Caminhos que deveríam ser...
Melhores definidos por alguns...
Evitando maiores tragédias!

Abraço menina Carmim!

Margarete Bretone disse...

Esse texto é para pensar muito. Venho de uma família muito religiosa, onde até cortar o cabelo não me era permitido. Ainda bem que não precisei ter uma vida paralela, simplesmente consegui provar aos meus pais que isso aconteceria e eles me deixaram andar com meus próprios pés... Infelizmente tem muitas Amandas por aí.

Anónimo disse...

Olá, é a primeira vez que visito seu blog e estou impressionado com a intensidade dos seus relatos! Excelente! De fato, existem muitas "Amandas Fulano de Tal" no mundo, e a perspectiva do status é capaz de cegar os olhos das pessoas com relação às coisas que mais interessam, e estas fogem do poder e da posição social! Parabéns!

Anne disse...

Adorei essa história! Infelizmente vemos muitas Amandas por aí...ainda bem que tive o privilégio de não nascer numa familia Fulana de Tal, mas mesmo assim, acho que na maioria das famílias mtas coisas são omitidas, escondidas, deixadas de lado... ainda falta mto diálogo e muita valorização de sentimentos e pensamentos, para que os relacionamentos sejam mais puros e verdadeiros entre todos.

Lindas palavras, adorei mesmo!
Beijos pra vc, Carmim!

AcidStorm disse...

Bem interessante essa história... e eu só queria saber, se a vida de um ser humano não é o que realmente importa, então o que é importante?

Adorei.
Um abraço e uma ótima terça-feira

Flor disse...

Minha doce Carmim, minha doce Amiga... venho de corrida dizer-te que a minha alma, neste instante, abraça a tua com muito muito carinho e enorme admiração pelo Ser maravilhoso que és!

Vou dizer-Te uma coisa... pois já à muito que o não digo!.... GOSTO MUITO DE TI, Amiga.... :)

Que tudo de bom a vida te conceda.

Flor deixa mil beijos carmim :-)*****

Anónimo disse...

Belo texto!
Bjitos!